A Vida 30/01/2013
Hoje fazendo um balanço de minha vida, me dei conta que há quase um ano não produzo nada, nada adicionei. Passei praticamente um ano lutando contra a vida, temendo viver, assustado com o futuro, olhando para o passado.
Isso me fez refletir de como a vida humana se assemelha a uma viagem de trem, algo que os jovens provavelmente não tenham a menor ideia, mas que para nós “mais vividos” a correlação se torna mais fácil.
À infância, o início da jornada, é o esforço para romper a inércia, tudo é novidade: experiências; pessoas; sabores; formas; cores. Em nosso minúsculo mundo a vida, se movendo lentamente, gradualmente avança. À medida que vamos aprendendo a vida vai ganhando velocidade. Afinal, como aprendemos em física: acelerar um corpo é variar sua velocidade em um período de tempo.
Na juventude temos pressa para tudo, principalmente para viver. Temos a sensação de que tudo o que é bom e interessante está no amanhã. Vivemos a ânsia do porvir, buscamos acelerar a vida para mais rapidamente chegar... Onde? Não sabemos com clareza.
Afinal a aceleração é a rapidez com a qual a velocidade de um corpo varia no tempo, e na juventude vivemos buscando a rapidez. Pressa para aprender, para amar, para sofrer, para viver. Temos tanta pressa que, na maioria das vezes, deixamos de desfrutar na plenitude as experiências únicas da juventude, alguns apenas passando sem viver, por essa fase mais bela da vida.
Nesse turbilhão ainda somos obrigados, prematuramente, a tomar decisões que irão afetar todo o nosso futuro. Sem as informações, nem a vivência necessárias, temos que escolher ramais, direções que poderão nos levar a lugares e situações distantes das que queríamos seguir. Para alguns, a vida dá uma segunda chance de, em um desvio, retornar ao caminho desejado. Outros, porém, têm que se adaptar à nova jornada, moldando-se às novas condições que eles mesmos se impuseram para viver: “se não podemos fazer o que amamos, devemos que amar o que fazemos”.
Assim chegamos à maturidade, momento de iniciarmos a colheita daquilo que cultivamos. Nesse período a velocidade da vida já nos chama a atenção, ainda que não incomode muito, tão atarefados que estamos em consolidar situações, relações, ambições, enfim, de tornar real tudo o que sonhamos, ou, pelo menos, o que nos foi dado a construir.
A maturidade é o momento de fincarmos mais profundamente nossas raízes, consolidando relações de amizades e familiares; profissionais e econômicas; sociais e até mesmo políticas. É nessa fase que temos uma visão mais ampla do mundo que nos rodeia, que as escolhas podem ser feitas com mais ponderação. Na maturidade teremos de gastar o cabedal de conhecimentos que acumulamos, para escolher e seguir caminhos firmes e seguros, já como timoneiros absolutos de nossos destinos.
Nessa fase a velocidade da vida por vezes nos assusta, nos dando a sensação de que não teremos tempo para realizar tudo o que planejamos. Absolutamente envolvidos em realizar não nos damos conta do tempo, quando piscamos os olhos, nossos filhos são adultos, nossas carreiras se findaram ou aproximam-se disso e, o que é pior, aquela imagem refletida no espelho nos mostra um ancião, que ainda não estávamos preparados para ser.
Nesse momento temos a sensação que a vida segue em desvairada carreira, mal nos dando tempo de vivê-la. O caminho à frente se nos apresenta muito menor do que aquele que já percorremos. Como em uma viagem de trem, mais passageiros que conosco viajavam vão desembarcando, nos transmitindo um sentimento crescente de solidão.
Como disse o poeta: ̶— “nossos ídolos ainda são os mesmos” — mas cada vez menos pessoas lembram-se deles. Nossos sonhos juvenis, “apesar de havermos feito tudo o que fizemos”, nada ou quase nada alteraram a forma de viver e de conviver dos seres humanos. As mesmas injustiças, fatalidades e mazelas ainda assolam a humanidade, não importando o quanto acreditássemos que tudo poderíamos mudar.
Olhar para frente se nos apresenta um caminho turvo, escuro, frio e incomodamente desconhecido, algo quase que insuportável nessa fase da vida onde cremos tudo saber.
Olhar para trás nos aperta o coração na saudade de um tempo que se foi. Perdemo-nos em devaneios, mesmo sabendo que não poderemos recuperar o tempo passado, que não poderemos viver novamente o que já vivemos e então o verso do poeta toma sentido: “A vida é muito grande para uma só vida”. |